cover.jpg
portadilla.jpg

 

 

Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2002 Anne Herries

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

O xeque, n.º 192 - Fevereiro 2014

Título original: The Sheikh

Publicada originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres

Publicado em português em 2009

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5027-9

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

Um

 

– E essa é a notícia – disse Chloe, tentando conter a emoção. – Parto para Marrocos na próxima semana e não sei quando vou voltar...

– Que sorte! – gritou Justine, olhando para a sua prima com inveja. – A única coisa que consegui foi um emprego na biblioteca do bairro e isso depois de passar anos a estudar na faculdade.

Justine franziu os seus lábios pintados e adoptou uma posição que lhe agradava pelo seu lado artístico.

Chloe Randall tentou mostrar-se compassiva perante os protestos de Justine pelo seu azar na altura de arranjar um emprego interessante; no entanto, não conseguia deixar de sorrir.

Chloe tinha a boca bonita e os lábios suaves e carnudos, e, ao contrário da sua prima, que tanto gostava de se pintar, ela preferia não usar maquilhagem. Tinha o cabelo loiro e liso, pelos ombros, e naquele momento usava-o preso com um lenço. Justine cortara o cabelo há pouco tempo e usava um corte muito na moda entre as artistas do cinema mudo: curto atrás e mais comprido à frente. Chloe pensava que a sua prima era muito atrevida ao pintar os lábios com aquele vermelho intenso.

As duas tinham ar do que eram: duas jovens de boas famílias que abandonavam as restrições da sua educação e começavam a abrir as asas como borboletas para o sol da liberdade. Estavam em 1925. A terrível guerra que tinha destruído as vidas da geração anterior era quase uma lembrança distante e, naquele momento, a vida parecia feita para aproveitar.

– Foi por pura sorte – disse Chloe, talvez pela enésima vez naquela noite, enquanto se levantava para rodar a manivela do gramofone e ouvir mais uma vez a sua canção favorita de Paul Robeson. – Adoro-o. Foi óptimo vê-lo a actuar quando o papá me levou.

– Ai, por favor, não voltes a pô-lo! – rogou Justine. – Tenho um disco novo de jazz que gostava que ouvisses. Senta-te e conta-me o que aconteceu, e como conheceste esse catedrático...

– Como estava a dizer-te, foi por pura sorte.

Chloe deixou o gramofone e sentou-se com as pernas cruzadas sobre um monte de almofadas, como se de uma sala árabe se tratasse. Aquela era outra das modas passageiras de Justine e também muito popular entre as jovens de sociedade.

– Eu estava no departamento de investigação do museu quando ele entrou. Numa mão trazia um guarda-chuva e na outra, vários embrulhos e um saco de laranjas. O saco de papel onde estavam as laranjas molhara-se com a chuva e, de repente, as laranjas começaram a rolar pelo chão.

Justine desatou a rir-se enquanto imaginava a cena. Embora tentasse ser sofisticada, no fundo continuava a ser uma rapariga inocente, fascinada com as estrelas do ecrã que via cada vez que ia ao cinema, que, no seu caso, era com muita frequência, pois tinha uns pais ricos que a mimavam com quase todos os caprichos.

Nisso tinha mais sorte do que Chloe, que tinha perdido a sua mãe, vítima de uma doença agónica enquanto ela estava a estudar fora, e cujo pai, na opinião de Justine, sempre fora um homem bastante frio. Mas, por amor e lealdade à sua prima, nunca quisera expressar em voz alta essa opinião.

– Como disseste que se chama...? Refiro-me ao catedrático.

– Hicks... Charles Hicks – respondeu Chloe, enquanto afastava uma madeixa de cabelo dos olhos. – O facto é que o ajudei a apanhar as laranjas do chão e começámos a falar, e Charles Hicks conhece o meu pai há muito tempo. Conforme parece, Hicks foi ao meu baptizado, mas perdeu o contacto com o meu pai quando partiu para o Egipto, pouco depois do baptizado. Naturalmente, convidei-o para jantar lá em casa.

– E foi então que te perguntou se gostarias de o acompanhar a Marrocos – Justine olhava fixamente para ela, com uma mistura de inveja e incredulidade.

– Sim, para o ajudar num projecto de investigação – concedeu Chloe, que não conseguia deixar de sorrir. – Neste momento, está a trabalhar num livro baseado em várias tribos nómadas, particularmente os povos beduíno e berbere. Já levou a cabo a maior parte da investigação baseada nos beduínos, que povoam grande parte do norte de África, e agora quer fazer um estudo dos berberes, conforme parece, para poder comparar as duas etnias. Também lhe interessam os costumes religiosos e tem intenção de visitar muitos sítios que são considerados sagrados; se conseguir permissão, claro! É tudo um pouco complicado e eu não entendo muito. Mas é interessante, não te parece?

Desatou a rir-se ao ver o olhar sem expressão de Justine. Estava muito claro que a sua prima não estava muito convencida, mas também era verdade que os interesses de Justine se limitavam à roupa, aos bailes e a ir ao cinema, como acontecia com a maioria das jovens daquela época.

– Quando o papá lhe comentou que me interessava a literatura árabe, Hicks pensou que seria a pessoa ideal para o ajudar, sobretudo porque sei estenografia.

– E tu aproveitaste a oportunidade, é claro... – suspirou Justine. – Oxalá conhecesse alguém que me pagasse umas férias no estrangeiro!

– E eu gostava que pudesses acompanhar-nos – pensou Chloe, com pesar. – Mas o professor Hicks vai pagar-me as despesas todas, portanto, não posso pedir-lhe para convidar a minha prima. Duvido muito que precise de ajuda com a investigação, mas o papá disse-lhe que tinha acabado os meus estudos universitários e que estava à procura de emprego enquanto levava a cabo a minha própria investigação. Isso impressionou-o bastante e disse que admirava as jovens que preferiam criar uma carreira, em vez de se casarem imediatamente.

– Bom, suponho que é o que a maioria de nós faz: casar e ter filhos – disse Justine, com certo desagrado. – Tu és uma excepção, Chloe. Eu fui para a universidade porque o meu pai quis e, como tu já estavas a estudar, foi divertido. Mas a mamã espera fazer a minha apresentação à sociedade e suponho que ficarei noiva o mais depressa possível... Isso se for capaz de encontrar alguém que se pareça com ele.

Justine pegou numa revista que tinha encontrado naquela manhã na biblioteca. No interior havia uma fotografia do actor Rodolfo Valentino que ocupava uma página inteira, onde também se anunciava o seu último filme.

– Temos de ir vê-lo antes de te ires embora – disse Justine, enquanto suspirava pelo ídolo do grande ecrã. – Já vi os seus filmes muitas vezes, mas o meu preferido é O xeque. Dizem que está a pensar em fazer a segunda parte muito em breve.

– Ah, é maravilhoso! – concedeu Chloe, enquanto cruzava as pernas.

Naquele dia, usava uma saia curta que a sua avó, lady Margaret Hatton, considerava terrivelmente indecente e meias de seda.

– Maravilhoso! – Justine abriu a cigarreira de prata que havia numa mesa de apoio junto dela e ofereceu um cigarro a Chloe. – Ah, pois, tu não fumas! – comentou, ao ver que a sua prima abanava a cabeça. – A mamã detesta que fume se ela estiver presente, mas o papá não se importa. Diz que há coisas piores do que ver uma mulher a fumar e, além disso, ele também fuma muito. Eu pareço-me com ele, pelo menos, é o que a mamã costuma dizer quando se zanga comigo.

Justine desatou a rir-se. Chloe sorriu com afecto. Justine era bonita e esperta, e costumava dizer coisas de ânimo leve apenas porque lhe pareciam inteligentes. Estava na moda comportar-se daquele modo ligeiramente escandaloso, que Justine favorecia com as suas amizades, mas Chloe sabia que, no fundo, a sua prima não era absolutamente louca. Quando aparecesse o homem certo, Justine apaixonar-se-ia, casar-se-ia e viveria numa bonita casa no campo; de vez em quando, iria à cidade e seria muito feliz. Os seus pais mimavam-na continuamente, o que era muito agradável. Chloe não se teria importado que o seu pai também a mimasse um pouco, embora fosse realista e soubesse que não era nada provável que o seu pai mudasse de maneira de ser.

Sempre fora um homem reservado, mas, desde a morte da sua mãe, encerrara-se ainda mais no seu próprio mundo, deixando que Chloe se desenvencilhasse sozinha a maior parte das vezes. Se não fosse Justine, por quem sentia um grande carinho, Chloe tinha a certeza de que se teria sentido bastante sozinha.

A sua avó já raramente saía da casa onde vivia, no norte de Inglaterra, pois não estava de boa saúde. Lady Margaret preferia não receber visitas, embora, uma vez por ano, pedisse que a sua neta fosse visitá-la e se lembrasse de lhe enviar um postal no seu aniversário.

– Suponho que quererás casar-te – disse a Justine, – quando encontrares a pessoa certa.

– E tu, não queres casar-te? – Justine olhou para ela, com curiosidade.

– Com o tempo, talvez, mas ainda não.

Chloe queria fazer algo mais com a sua vida do que tinha feito a sua mãe, sendo a esposa de Peter Randall. Sabia que uma vida parecida com a da sua mãe, ou inclusive a de Justine, que tinha uma vida social intensa, não seria para ela. Ela não tinha a certeza do que pretendia, mas qualquer um que fosse um pouco observador se daria conta de que o que ela precisava era de afecto.

– Não faz mal fumares, se gostares – comentou Chloe, enquanto a sua prima tirava um cigarro da cigarreira. – Mas dá-me tosse e, além disso, não gosto do sabor.

– Ah, bom... Habituas-te ao sabor.

Justine não pensava reconhecer que só o fazia porque os seus amigos boémios diziam que era elegante.

Tinha de fazer parte do grupo porque queria que a convidassem para as melhores festas. Olhou para a revista que tinha sobre o colo e suspirou novamente.

– Alguma vez pensaste como seria conhecer um xeque a sério, Chloe? Achas que seria como Valentino?

– Absolutamente, não acredito – respondeu Chloe, morta de riso.

Chloe estava a rir-se tanto da sua prima, que naquele momento dava um bafo delicado no cigarro que segurava com a sua boquilha elegante, como da eventualidade, mas não disse nada a Justine.

– Certamente, seria gordo, gorduroso e fedorento – continuou Chloe.

– Ai, não! – exclamou Justine, num tom melodramático, enquanto inclinava a cabeça para trás, tal como fazia a grande Gloria Swanson no ecrã. – Por favor, não estragues as minhas fantasias! Fica a saber que sonhei que conhecia Valentino... e que ele me pegava ao colo e me levava para a sua tenda no deserto – Justine tremeu deliciosamente com a ideia.

– Tu e milhões de mulheres – disse Chloe, sorrindo.

Ela também já se imaginara numa situação semelhante às vividas pela jovem escrava interpretada pela actriz Agnes Ayres, mas, no fundo, não tinha a ilusão de conhecer alguém que a transportasse para aquele mundo romântico dos filmes.

– Mas concordo que seria romântico conhecer Rodolfo Valentino... Imagina se alguém te propusesse trabalhar com ele num filme.

– Ah, adorava ter essa oportunidade! – exclamou Justine e desatou a rir-se. – Continuo a pensar que seria muito romântico deixar que um xeque me levasse para a sua tenda do deserto sob as estrelas...

– Embora, se calhar, ao chegares lá, descobrisses que não gostas do xeque – disse Chloe. – Acho que é mais seguro ficar pelo filme.

Com frequência, também ela tinha pensado em como seria emocionante entrar num filme de Hollywood e sorriu enquanto imaginava que lhe ofereciam o papel de escrava num filme semelhante a O Xeque. Como é claro, era apenas um sonho tolo que ela jamais tinha contado a alguém, nem sequer a Justine.

– Bom, terei de me contentar com o meu emprego de bibliotecária até que apareça o meu príncipe encantado e me faça perder a cabeça – disse Justine. – Pelo menos, tu tens umas férias emocionantes pela frente.

– Não são só férias – disse Chloe. – O professor Hicks é um bom homem, mas atrevo-me a dizer que quererá que trabalhe um pouco em troca desse privilégio.

– É uma pena que seja tão velho – respondeu Justine, com cara de pesar. – É mais velho do que o teu pai. Mas, nunca se sabe, se calhar, conheces alguém emocionante durante a viagem, Chloe, um homem atraente e moreno que te leve para a sua casbah...

– Duvido muito – interrompeu-a Chloe. Mas as suas dúvidas não a impediam de sonhar.

No fundo, era tão romântica como Justine, embora tentasse não o ser. O seu pai sempre lhe dissera que devia manter a cabeça fria e avaliar a situação antes de tomar uma decisão. Chloe sabia que era melhor não sonhar para não esperar demasiado, porque, se se deixasse levar pelos seus desejos, acabaria decepcionada.

«Se agires impulsivamente, talvez te arrependas disso a vida inteira.» Esse sempre fora o lema que tinha regido a vida de Peter Randall.

Era, sem dúvida, um modo muito sensato de ver as coisas, mas podia ser um pouco aborrecido, pelo menos, assim o confirmara Chloe. Às vezes, dizia a si mesma que seria emocionante fazer uma loucura ou qualquer coisa totalmente irresponsável de vez em quando.

– Bom, todos podemos sonhar – disse Justine, antes de se levantar para pôr o disco novo que comprara. – Olha, Chloe... Vê isto!

Chloe desatou a rir-se quando Justine começou a mostrar-lhe uma das últimas danças da moda. A sua prima tinha sempre uma novidade e talvez fosse por isso que Chloe gostava tanto de estar com ela.

– Ah... Oxalá pudesses ir connosco! – suspirou Chloe. – Mas suponho que não serve de nada suspirar em vão.

– De qualquer modo, a mamã nunca estaria de acordo com uma viagem assim – disse Justine. – Está empenhada em que me case com alguém muito rico e muito aborrecido.

Chloe abanou a cabeça.

– Bom, o primeiro não seria assim tão mau, Justine. O pobre papá sempre teve dificuldades em seguir em frente depois da guerra. Investiu numa empresa que fracassou e os seus rendimentos viram-se reduzidos a quase metade. É por isso que estou tão contente por ter conseguido um emprego ao acabar a universidade.

– Bom, o dinheiro não me importava – concedeu Justine. – Na verdade, já me vejo envolta em peles e adornada com jóias, a passar o Verão na Cotê d’Azur e o Inverno em Biarritz...

– Sim – concedeu Chloe. – E, se tiver muito dinheiro, Justine, talvez não seja assim tão aborrecido.

 

 

Era emocionante que os seus amigos viessem despedir-se antes de iniciar uma travessia num transatlântico de luxo. A bordo, o ambiente era como o de uma festa gigantesca: as garrafas de champanhe abriam-se constantemente, as pessoas riam-se, enquanto o vento agitava os milhares de bandeirinhas que decoravam o navio. Toda a gente parecia ter amigos que se aproximavam para lhes desejar boa viagem e Chloe alegrou-se por o seu pai e Justine terem insistido em fazer a viagem com ela até Southampton.

Tinha reparado que a maioria dos outros passageiros que estavam a bordo eram ricos: mulheres vestidas com elegância entre as quais abundavam as peles apoiadas sobre um ombro e homens tranquilos e seguros de si mesmos, embora com frequência vestissem um estilo sóbrio. Talvez por isso tivesse reparado quase imediatamente nele, porque se destacava entre os outros. Usava um fato bege elegante e sapatos de couro artesanais. A camisa era como as que podia encontrar-se em Saville Row.

– Aquele é o aviso para descermos do navio – disse-lhe o seu pai, antes de a beijar. – Cuida-te bem, querida. Diverte-te e sê o máximo possível útil a Charles. Sobretudo, faz o que te disser e porta-te bem. Quero estar orgulhoso da minha filha e Charles foi muito atencioso ao dar-te este emprego.

– Sim, é claro, papá – disse Chloe, enquanto também abraçava o seu pai. – E cuida-te também.

Ele assentiu e afastou-se com dinamismo da sua filha.

– Vou despedir-me de Charles.

– Sim, tens de o fazer.

– Meninas, despeçam-se depressa – avisou-as o senhor Randall, antes de se perder entre a multidão.

Naquele momento, deixou-as sozinhas junto do corrimão.

– Ah, bolas! – exclamou Justine. – Parece-me que agora terei de descer sozinha – fez uma careta. – Oxalá pudesse ir contigo – beijou Chloe. – Não faças nada que eu não fizesse...! E não fujas com um xeque!

Atirou os braços para trás com dramatismo e, sem querer, bateu num homem que estava de pé atrás dela.

– Tenha cuidado, menina!

Justine batera-lhe no braço, fazendo com que entornasse o copo de champanhe que o homem tinha na mão. Era o mesmo homem em que Chloe reparara antes. Reparou no grupo de amigos que pareciam ter vindo despedir-se dele, todos eles vestidos com a mesma elegância que ele; um deles era uma linda jovem. O homem ficou a olhar para Justine, com expressão colérica. Ao ver que Justine ficava morta de calor, Chloe decidiu dar a cara pela sua prima.

– Acho que foi bastante insensato da sua parte trazer um copo para bordo, havendo tanta gente aqui, não lhe parece? – perguntou Chloe. – Justine fê-lo sem querer.

– É claro... – disse Justine, que lhe sorriu com as faces muito coradas. – Lamento imenso. Espero não o ter importunado muito.

– Certamente, o fato não terá solução, mas não tem nenhuma consequência.

O homem virou-se.

– Que homem tão mal-educado! – dizia Chloe, que avançava encostada ao corrimão.

À medida que as pessoas iam abandonando o navio, havia mais espaço para se mexer com liberdade.

– Foi culpa dele, por se aproximar tanto de ti – acrescentou Chloe, com aborrecimento.

– Suponho que queria agitar a mão para se despedir mais uma vez dos amigos que estivessem em terra – disse Justine. – Meu Deus, tenho de me ir embora ou levam-me contigo!

Deram outro abraço e Justine saiu a correr para se juntar às últimas pessoas que abandonavam o navio. Chloe sorriu quando viu que a sua amiga agarrava o chapéu para tentar cumprimentá-la com a mão. Quando perdeu de vista Justine, Chloe virou-se para procurar os seus companheiros de viagem. Ao ver o senhor Hicks e a sua secretária, a menina Amelia Ramsbottom, levantou o braço para chamar a sua atenção. Naquele momento, ouviu uma exclamação contida atrás de si e, quando Chloe se virou, viu que tinha acabado de entornar o resto do champanhe do homem que Justine tinha empurrado sem querer, pouco antes.

– Vejo que está empenhada em estragar-me o fato – disse ele.

Pareceu a Chloe detectar um brilho de humor no seu olhar.

– Fiz-lhe alguma coisa que a tenha incomodado? – acrescentou o homem.

Chloe mordeu o lábio. Sentiu a tentação de lhe responder mal, mas iriam passar alguns dias no mesmo navio e não fazia sentido iniciar a viagem criando um ambiente desagradável, já que era impossível que não se encontrassem de vez em quando.

– Desculpe – disse ela, tentando recompor-se. – Poderão limpar-lho a bordo? Eu mesma me encarregarei da conta.

– Não há problema – daquela vez, o homem sorriu.

Chloe deu-se conta de que era bastante atraente quando sorria e que as feições se afastavam da dureza que tinham reflectido pouco antes. Tinha o cabelo preto, curto e penteado para trás, e uns olhos quase tão escuros como o cabelo. Falava com sotaque inglês de classe alta, mas, de alguma forma, não lhe parecia inglês. Além disso, tinha as feições demasiado marcadas, talvez exóticas? Não saberia dizê-lo.

– Passa-se alguma coisa? – perguntou o homem, com o sobrolho franzido.

Chloe apercebeu-se então de que ficara a olhar fixamente para ele e corou.

– Não, desculpe. Devo ir ter com os meus amigos.

E, dito isso, Chloe deixou-o bruscamente e foi-se embora a correr, com o coração acelerado. Aquele homem possuía qualquer coisa enervante, qualquer coisa que a transtornava; talvez fosse arrogância ou talvez alguma coisa que não era capaz de identificar... Uma sensação de que, por baixo daquela superfície distinta, aquele homem não era o que parecia. Certamente, não se parecia com a maioria dos homens que ela conhecia.

Na faculdade, conhecera catedráticos muito sérios, irmãos, pais ou primos das suas amigas e colegas de estudos. Todos se pareciam muito, sendo a maioria cavalheiros e filhos de cavalheiros. Alguns eram mais agradáveis do que outros, como é claro, mas todos se comportavam bem e a tratavam com o respeito que merecia uma rapariga de boas famílias.

Às vezes, Chloe quase tinha desejado que não tivessem sido tão respeitosos, mas sabia que ela não era o tipo de rapariga que deixava os homens loucos. Não era esperta e bonita como Justine, mas não se dava conta de que as suas maneiras caladas eram em si muito atraentes, nem de que, à sua maneira, era bonita.

– Ah, estás aqui, querida! – Charles Hicks cumprimentou-a com um sorriso. – Perguntávamo-nos o que teria sido de ti, não é verdade, Amelia?

O catedrático e a sua secretária, que tinha um aspecto parecido com o dele, já tinham visto muitas despedidas assim a bordo dos navios e, por isso, tinham preferido permanecer atrás da multidão que lotava os corrimões. Os dois usavam fatos sóbrios de tweed, que Chloe achou pouco adequados para a ocasião.

– Ah, Chloe estava a despedir-se da sua amiga... – disse Amelia Ramsbottom. – Não pode esperar que passe o tempo todo connosco, Charles. É jovem e esta é a primeira vez que está a bordo de um transatlântico. Deve aproveitar enquanto puder.

Chloe apercebeu-se de que a secretária do catedrático tinha umas maneiras um pouco hostis e suspeitou que talvez se sentisse um pouco ciumenta dela. Amelia viajava com ele há anos e devia perguntar-se porque tinha convidado uma rapariga para os acompanhar daquela vez. Ela também o tinha perguntado ao princípio, mas suspeitava que fora uma simples amabilidade por parte de um velho amigo do seu pai. Charles Hicks era um homem próspero que podia permitir-se certos caprichos e, sem dúvida, dera-se conta de que em casa dos Randall andavam um pouco apertados de dinheiro.

– Certamente, é tudo muito emocionante – disse Chloe. – Mas quero ajudar o professor Hicks em tudo o que puder.

– Não vou precisar de ti o tempo todo – respondeu o homem. – Deves aproveitar o cruzeiro, querida. Talvez te peça, algumas vezes, que tomes algumas notas. Amelia passa o meu trabalho todo à máquina de uma forma maravilhosa, mas falo demasiado depressa para ela quando estou a ditar. As tuas noções de estenografia ser-nos-ão úteis.

– Vou para o meu camarote – anunciou Amelia. – Se fosse a ti, Chloe, faria o mesmo. Talvez te sintas um pouco indisposta assim que nos afastarmos um pouco da costa.

Charles Hicks observou-a. Amelia era uma mulher baixa, magra, com o cabelo grisalho e maneiras afectadas.

– Receio que Amelia não passe muito bem a bordo de um navio, Chloe. Foi durante muitos anos uma companheira leal, mas acredito realmente que preferisse ficar em Inglaterra. Penso que talvez esta seja a minha última aventura.

– Oh, isso seria uma pena, senhor!

– Por favor, não me chames «senhor»; apenas Charles. Deves chamar-me Charles.

Os seus olhos azuis descoloridos sorriram-lhe. Embora já fosse idoso, Charles Hicks continuava a ser um homem atraente.

– Tenho sessenta e nove anos, Chloe. Acho que me contentarei com ficar um pouco tranquilo, depois de ter feito esta viagem. Passei muitos anos no Egipto e estive no deserto inúmeras vezes, mas continuo à procura de uma cidade perdida... – desatou a rir-se quando ela olhou para ele. – Uma coisa tão maravilhosa como Petra e cuja descoberta teria o meu nome... Mas receio que nunca a encontrarei.

Chloe sorriu compreensivamente. Sabia da cidade de Petra, que significava «cidade de pedra» e era uma cidade antiga, situada entre o Mar Morto e o Golfo de Aqabah, perto da intersecção das importantes rotas das caravanas que viajavam desde Gaza até ao Mediterrâneo. Fora uma cidade florescente na sua altura, mas depois ficara em ruínas e perdera-se entre as areias do deserto. No século dezanove, um investigador suíço tinha-a encontrado.

– Suponho que muita gente gostaria de descobrir uma coisa tão maravilhosa como Petra – disse Chloe. – Como sabe, interessa-me encontrar belas poesias que estejam há muito tempo no esquecimento. Como é claro, não leio em árabe, embora seja capaz de reconhecer algumas palavras, mas investiguei um pouco e tive a sorte de encontrar algumas traduções muito boas em inglês e francês, que estou a coleccionar com a esperança de as publicar um dia.

– Sim, o teu pai disse-me. Parece-me uma coisa muito interessante. Tens de me mostrar o teu trabalho um dia, Chloe... Mas acho que agora é melhor que sigas o exemplo de Amelia e procures os nossos camarotes.

 

 

Deram um camarote interior a Chloe, algo que, em parte, a decepcionou, pois teria gostado de poder espreitar pela escotilha para ver o mar e o céu. Mas sabia que eram mais caros e, de qualquer modo, não tinha intenção de passar muito tempo fechada no camarote.

Perguntou-se quanto tempo demoraria até começar a enjoar, mas depressa se deu conta de que o ligeiro vaivém do navio não a afectava. Talvez fosse diferente com o mar picado, mas, por enquanto, sentia-se bem e estava a apreciar a travessia.

Amelia não subiu para jantar com eles naquela noite, o que pareceu uma pena a Chloe, já que na sala de jantar havia um ambiente festivo, o comandante do navio cumprimentou todos os convidados e deu-lhes as boas-vindas antes de se sentar para jantar. Chloe e o professor não foram convidados a sentar-se na mesa mais importante naquela noite, mas os outros passageiros que estavam com eles à mesa mostraram-se amáveis e simpáticos, e Chloe gostou de os conhecer e de conversar com todos eles.

– Este é o seu primeiro cruzeiro? – perguntou-lhe uma mulher bastante rechonchuda, chamada senhora Vermont. – Eu já sou uma viajante experiente, como é claro, mas a minha sobrinha Jane é a primeira vez que vem comigo. Farão companhia uma à outra. Não vos parece sortudo que se tenham conhecido, raparigas?

Jane Vermont pareceu uma menina bastante tola a Chloe, mas eram mais ou menos da mesma idade, de modo que lhe sorriu e acedeu à sugestão da tia. Seria impossível, de qualquer modo, evitar os Vermont e teria de ter alguém com quem falar. A maioria dos outros passageiros parecia muito mais velha, o que era um pouco decepcionante.

– O que vais fazer depois do jantar? – perguntou-lhe Jane. – Há imensos entretenimentos: um baile, um espectáculo e, esta noite, dão um filme. Eu gostaria de o ver, mas a tia Vera não quer ir.

– Depende – disse Chloe, com cautela. – O que vão passar?

– Não tenho a certeza... Perguntamos depois ao comandante?

Chloe pensou que o comandante teria coisas mais importantes para fazer e certamente haveria muitos empregados por ali a quem perguntar. Jane olhava naquele momento para a mesa principal, sorria e agitava a mão, claramente tentando chamar a atenção.

Chloe também olhou para a mesa e viu que um dos convidados que tivera a honra de se sentar ali era o homem com quem chocara antes. Usava um elegante smoking preto e uma camisa de um branco imaculado, com laço preto. Ao olhar para ele, ele pareceu aperceber-se da sua presença e levantou o copo em jeito de saudação.

– Quem é aquele homem tão divino? – perguntou Jane, imediatamente. – É tão bonito... Tal como Rodolfo Valentino. Tão moreno e misterioso, e, ao mesmo tempo, tão imponente... – Jane tremeu, com dramatismo. – Conhece-lo, Chloe?

– Não... Só nos encontrámos brevemente na coberta ao zarparmos, mas não fomos apresentados.

Chloe desceu a vista. O salmão fumado que tinha no prato parecia-lhe, de repente, muito interessante e a partir daquele instante não desviou os olhos do prato. Tolamente, o coração pulsava-lhe muito depressa e receou ter corado.

– Bom, parece muito interessado em ti – disse Jane, morta de riso. – Tomara que também me olhasse com tanto... ardor; sim, essa é a palavra adequada – Jane sorriu-lhe, mas só conseguiu um olhar insosso do homem. – Sabias que há uma equipa de rodagem a bordo do navio? Ouvi dizer que são americanos.

– Uma equipa de rodagem? – Chloe olhou para ela, com atenção. – Não fazia ideia... Há algum actor ou actriz famoso entre eles?

– Não... Acho que, certamente, terão apanhado um avião para onde quer que se dirijam. Mas o realizador acompanha a equipa. Parece-me que quer fazer algumas cenas a bordo. Dizem que está à procura de uma estrela para o seu novo filme – Jane compôs a sua cabeleira preta ondulada. – Chloe, achas que me pareço um pouco com Mary Pickford?

Chloe pensou que Jane não se parecia absolutamente com a famosa estrela de cinema a quem todos chamavam a namorada do mundo, mas dava-lhe vergonha dizer-lho na cara.

– Bom, talvez um pouco – respondeu. – Tens o cabelo como ela o usava no seu último filme.

Viu que isso agradou a Jane, porque estava claro que a jovem fizera aquele penteado para se parecer tanto quanto possível com a famosa estrela.

Sinceramente, Jane parecia-lhe um pouco parva; Chloe teria preferido que a sua prima estivesse com ela no navio. Mas não servia de nada lamentar-se por causa de uma coisa que não aconteceria. Olhou brevemente para a mesa e viu que ele estava a acender um cigarro a uma mulher que estava sentada à sua esquerda. Era uma mulher muito bela, vestida elegantemente e muito segura de si mesma; naquele momento, a mulher sorria-lhe.

Chloe desviou imediatamente o olhar. Ela não pertencia àquele tipo de gente e não poderia competir com mulheres assim; claro que também não queria.

– Vá, diz-me que vais ver o filme comigo – disse Jane, quando as pessoas começaram a levantar-se das mesas, pouco depois. – Acabei de perguntar a um dos empregados e disse que é o último de Valentino. Estou desejosa de o ver.

– Eu vi-o antes de vir – disse Chloe.

Mas, ao ver a cara de desilusão da sua amiga, Chloe mudou de ideias.

– Bom, suponho que não me importo de voltar a vê-lo – acrescentou.

– Vão-se embora, meninas – disse a senhora Vermont. – Eu fico aqui a fazer companhia ao professor Hicks.

Chloe percebeu a expressão de contrariedade do professor, que tentou disfarçar.

– Importa-se? – perguntou-lhe Chloe. – Ou quer que faça alguma coisa para si esta noite?

O professor pareceu tentado um instante, mas abanou a cabeça.

– Não sou um monstro para te pôr a trabalhar na tua primeira noite, Chloe. Não, minha querida, vai e diverte-te.

 

 

Jane saiu da pequena sala de projecção, encantada com o filme. Não parava de falar de como o protagonista masculino era bonito e interessante, ao ponto de Chloe pensar que ficaria louca.

– Na verdade, devia ir-me embora – disse ela. – Tenho de ir ver se a menina Ramsbottom precisa de alguma coisa antes de ir para o meu camarote.

Com a pressa de fugir da sua companheira, Chloe avançou por um corredor e contornou a esquina seguinte, pensando que esse seria o corredor para ir para o seu camarote e o da menina Ramsbottom. No entanto, ao chegar ao fim e ver que desembocava noutro corredor que ia noutra direcção, deu-se conta de que se enganara.

Ao virar-se para trás, viu que ele se dirigia para ela e hesitou, perguntando-se se haveria uma maneira de evitar outro encontro. Ficaria mal se regressasse ao corredor que já sabia que só conduzia aos camarotes de primeira classe, portanto só lhe restava permanecer ali.

– Ah, parece que voltamos a encontrar-nos! – exclamou ele, com expressão de humor. – Acho que devíamos apresentar-nos. Menina...?

Chloe hesitou e respirou fundo. Que situação tão ridícula!

– O meu nome é Chloe Randall – Chloe estendeu-lhe a mão. – Viajo com a menina Amelia Ramsbottom e o catedrático Charles Hicks... e parece que me enganei no corredor.

– É muito fácil que isso aconteça – apertou-lhe a mão um instante. – Sou Armand... Philip Armand... e, se me disser o número do camarote que procura, terei todo o prazer em ajudá-la a procurá-lo, menina Randall.

Chloe tentou decidir de que nacionalidade seria. O seu apelido soava um pouco francês, mas não lhe parecia absolutamente francês. E ele tinha hesitado um pouco ao dizer o seu nome, quase como se não fosse o seu nome verdadeiro. Mas porquê mentir assim?

– Eu... É um prazer conhecê-lo – respondeu Chloe, com formalidade, sentindo-se ridícula. – O meu camarote é o número cinquenta e dois e o da menina Ramsbottom é o cinquenta e nove. Queria ir ver como se encontra antes de ir para a cama; antes, não se sentia muito bem.

– Para a cama tão cedo?

O homem arqueou os sobrolhos e sorriu, com expressão cómica. Era o clássico homem vivido e sofisticado, e Chloe pensou em como devia parecer jovem e inocente àquele homem. Sabia que estava vestida de uma maneira um pouco infantil e que não estava tão elegante como as outras mulheres a bordo.

– Não devia pensar desse modo enquanto durar o cruzeiro, menina Randall. Uma jovem como a menina devia passar a noite a dançar com um par atraente.

Chloe sabia que estava a gozar com ela. Não tinha visto nenhum jovem atraente no navio e os poucos homens que encaixavam na sua descrição já teriam um par para dançar mais interessante do que a pequena Chloe Randall.

– Garanto-lhe que não tenho intenção de dançar com ninguém, senhor Armand – disse ela. – Foi um dia muito longo e estou cansada. Se pudesse indicar-me como chegar ao meu camarote, não o incomodo mais. Sobretudo, se houver alguém à sua espera...

Mas porque dissera aquilo? Dizendo-o parecia que lhe interessava... E não era assim! Philip Armand não lhe interessava absolutamente.

– Infelizmente, não há ninguém com quem me apeteça dançar – respondeu, esboçando um sorriso estranho. – A minha noiva teve de ficar em Londres. No entanto, eu gostaria que fosse o meu par se desejar dançar noutra noite... quando não estiver tão cansada.

Chloe sentiu que corava novamente. Porque conseguia que se sentisse como uma adolescente tola? Estava prestes a pedir-lhe outra vez que lhe mostrasse o caminho, quando viu um empregado a sair de um dos camarotes e se virou rapidamente para ele.

– É claro, menina! Indico-lhe já o caminho – respondeu o homem à sua pergunta urgente. – Eu mesmo vou para lá agora. Por favor, acompanhe-me. Boa noite, senhor Armand!

Parecia que não lhe tinha mentido quanto ao seu nome, pensou Chloe, enquanto assentia com a cabeça, antes de se virar para seguir o empregado. Philip Armand dirigiu-lhe um olhar jovial e continuou pelo corredor onde Chloe sabia que ficavam os camarotes de luxo. Eram muito maiores do que o dela e tinham um espaço no exterior onde o hóspede podia sair para apanhar ar. Tinham-lhe dito que também tinham uma pequena sala de estar e dois quartos grandes, e sentira uma certa inveja dos passageiros que podiam permitir-se esse luxo.

Chloe disse para si que tinha sorte por estar ali e que não devia pensar em tolices. Jamais teria tido oportunidade de viajar num transatlântico como aquele se não fosse a generosidade de Charles Hicks.

Quando chegou ao camarote de Amelia, bateu à porta. Ouviu a voz de Amelia que a convidava a entrar. A pobre mulher estava deitada na cama e parecia muito indisposta.

– Posso fazer alguma coisa por si? – perguntou-lhe Chloe. – Quer que chame o médico?

A mulher abanou a cabeça.

– Não, obrigada. O empregado já me deu um remédio para acalmar o estômago. És muito amável, Chloe, mas só quero ficar sozinha. Passará dentro de alguns dias.

– Lamento tê-la incomodado – disse Chloe e fechou a porta ao sair.

Voltou, pensativa, para o seu camarote. Quem seria o senhor Armand e porque lhe tinha parecido que mentira quando lhe dissera o seu nome?

Não havia razão alguma para lhe mentir, pelo menos, que ela soubesse. Talvez viajasse sob um nome falso. Mas porquê? Seria um espião...? Ou talvez um criminoso?

Pensou no seu rosto e decidiu que era muito parecido com uma fotografia de um príncipe estrangeiro que tinha visto num jornal. Não, um príncipe, não, mas qualquer coisa semelhante. Chloe não se lembrava onde tinha visto o artigo, mas parecia-lhe recordar que tinha alguma coisa a ver com política... Ou seria com o mundo dos negócios? Chloe decidiu esquecê-lo, por enquanto.

Além disso, certamente, não teria importância, porque não era provável que voltasse a relacionar-se com ele. Tinha a certeza de que, a partir daquela noite, Philip Armand a evitaria; sobretudo, se tivesse um copo na mão.

Chloe sorriu ao recordar a cara do homem quando Justine lhe entornara o copo. Daquela vez, parecia ter reagido bastante mal, mas parecia que da segunda vez tinha começado a ver o lado cómico do incidente. E, naquela noite, fora muito agradável com ela, embora suspeitasse que o homem se rira à sua custa.

Bocejou e começou a despir-se. Tinha muito sono e a conversa sem sentido de Jane Vermont tinha-a irritado sobremaneira. Pensou que seria uma pena que tivesse de a suportar durante a viagem e custou-lhe novamente que a sua prima não tivesse podido acompanhá-los.

Chloe deitou-se e adormeceu quase imediatamente. Sonhou com o filme que acabara de ver, mas, em algum momento, a cara do xeque transformou-se na do homem que acabara de conhecer.

– És uma mulher bela e perigosa – dizia-lhe, enquanto olhava para ela nos olhos. – Terei de te levar para a minha casbah e fechar-te...

Chloe acordou brevemente e lembrou-se de onde tinha visto o artigo. A seguir, adormeceu e esqueceu tudo outra vez...