Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2008 Rebecca Winters. Todos os direitos reservados.

APAIXONADA PELO CHEFE ESPANHOL, N.º 1251 - Abril 2012

Título original: Crazy About Her Spanish Boss

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em portugués em 2011

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® Harlequin, logotipo Harlequin e Bianca são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

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I.S.B.N.: 978-84-687-0239-1

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Capítulo 1

– Um conhaque para celebrar, Don Remi?

Remigio Alfonso de Vargas y Goyo virou-se para trás na cadeira de couro onde estava sentado. Não gostava que se referissem a ele como se fosse uma relíquia da realeza. Era arcaico. Ele era um homem da sua terra e, presentemente, um título era uma coisa absurda. Analisou o seu contabilista leal com certo cinismo, já que, normalmente, o tratava por tu.

– Para celebrar o quê?

O contabilista, que tinha quase setenta anos, serviu-se de um copo.

– O teu negócio superou o que… – começou a dizer, mas fez uma pausa. Corou e desviou o olhar. – Bom, digamos que, mais uma vez, a fazenda Goyo está a caminho de dar uma tremenda dor de cabeça aos seus adversários.

– Não te precipites, Luis. Estamos a meio de outra seca, que não se sabe quando vai acabar, e isso afecta muito os olivais. Deves ter noção disso.

Com a perda das colónias espanholas em meados do século XIX, a riqueza de Espanha vira-se diminuída e os Goyo tinham-se visto forçados a trabalhar para ganhar a vida. As fortunas dos anteriores duques de Goyo já tinham desaparecido.

– Portanto, diversificas de antemão.

– Como fez, em tempos, o meu pai? – perguntou Remi, rindo-se de maneira mordaz. – Acabou por ser o erro mais caro da sua vida e levou a que tanto a minha mãe como ele morressem antecipadamente. Receio que seja um purista.

Luis encolheu os ombros.

– Foi uma simples sugestão, Remi. Tu é que és o perito. Como posso dizer-te o que fazer?

– A tua longa relação profissional com o meu pai dá-te o direito de o fazer.

– Mesmo assim, eu só sou bom com os números.

– De facto, controla-los realmente bem – disse Remi, entredentes.

– Obrigado – respondeu o contabilista.

Remi levantou-se. Depois de dois longos e difíceis anos, finalmente tinha acabado de pagar a dívida bancária que o seu falecido pai tinha deixado. Com isso, tinha salvado a honra da sua família e a reputação desta na região. Mesmo assim, tinha temido aquela reunião com Luis. Cada vez que ia a Toledo de carro por motivos de negócios, recordava uma coisa obscura e amarga que só conseguia manter afastada da sua mente se permanecesse muito ocupado.

Mas, naquele momento, sentiu como a amargura que implicava a traição o percorria novamente por dentro. Em alturas como aquela, não era boa companhia para ninguém, muito menos para Luis, o qual sempre tinha tentado animá-lo. O seu leal empregado merecia mais.

Ansioso por regressar a casa, apressou-se a dirigir-se para a porta.

– Remi?

– Sim? – perguntou ele, olhando para Luis.

– Estou muito orgulhoso do que conseguiste. O teu pai também estaria.

Remi não estava assim tão certo disso. Desejou que o seu pai não tivesse maneira de saber que o filho de trinta e três anos tinha estado prestes a perder tudo o que tinham conseguido cinco gerações Goyo.

De maneira séria, assentiu com a cabeça a Luis e foi-se embora do escritório. Desceu a rua a toda a pressa, onde tinha deixado estacionado o seu carro preto, e sentiu o calor pesado que se tinha apoderado do centro de Espanha, como acontecia sempre em Julho.

Pensou que a vida dos produtores de azeite era árdua. Cada vez menos proprietários de latifúndios decidiam continuar em frente, mas era a sua vida. Embora tivesse visto todos os seus sonhos a destruírem-se, ainda lhe restava a propriedade que tinha herdado, a razão pela qual se levantava todas as manhãs.

Tirou o casaco e a gravata. Assim que os deixou no banco traseiro do veículo, entrou e sentou-se ao volante. Arrancou e saiu da cidade. Deixou para trás de si a imponente fortaleza de Toledo e o rio Tejo. Eram três horas da tarde e não havia muito trânsito. Enquanto conduzia, sentiu como os seus músculos relaxavam ao ter consciência de que, em menos de quinze minutos, estaria de volta à sua propriedade, onde o esperava muito trabalho.

O trabalho tinha-lhe salvado a vida…

Durante o dia, o trabalho físico evitava-lhe reviver o passado. Mas, infelizmente, as longas e escuras horas nocturnas faziam-no recordar os fantasmas contra os quais tinha de lutar constantemente. Quando acordava de manhã, estava emocionalmente exausto.

Pensativo, mal se apercebeu da presença de outro veículo ao longe. Este acabava de contornar uma curva e dirigia-se para ele. O condutor devia ter visto o touro que, repentinamente, atravessou a estrada ao mesmo tempo que ele. A velocidade a que ia tornava perigoso travar, mas o outro condutor obedeceu obviamente ao instinto e o carro virou bruscamente. Numa décima de segundo, dirigiu-se directamente contra ele, que virou o volante para a direita, para evitar a colisão.

Horrorizado, observou como o outro veículo derrapava e se virava do lado do acompanhante, momento em que parou.

Então, parou o seu próprio veículo e apressou-se a sair. Aproximou-se do carro azul acidentado, cujas rodas ainda estavam a rodar. Os pára-brisas dianteiro e traseiro tinham-se partido. Havia vidros por toda a parte. Olhou para dentro do carro e viu que o condutor era o único ocupante. Era uma mulher. E estava a queixar-se.

Graças a Deus, estava viva! O cinto de segurança tinha impedido que saísse disparada do veículo.

Tentou abrir a porta do condutor, mas foi impossível, por isso, entrou dentro do carro pelo pára-brisas dianteiro.

– Vai ficar bem, minha senhora – garantiu à acidentada.

– Ajude-me… – suplicou ela. – O meu olho… Não consigo ver – acrescentou, com um claro sotaque nor te-americano.

– Fique quieta – respondeu ele. – Não toque no olho ou piorará. Vou tirá-la do veículo, mas não faça nenhum esforço.

Então, desapertou-lhe o cinto de segurança e pôde ver que a mulher sangrava do lado direito da cara. Estava ferida. A cabeleira loira, que lhe chegava aos ombros, estava ensopada em sangue. Agarrou-a e, com muito cuidado, tirou-a do carro pelo pára-brisas dianteiro, e deixou-a sobre o terreno que havia junto da estrada.

– Vou chamar uma ambulância. Não se mexa.

– Não o farei – respondeu ela, com voz trémula.

A palidez da cara daquela mulher, assim como a maneira como estava a apertar os punhos, evidenciou a dor que estava a suportar. Mas, em vez de gritar de maneira histérica, mostrou uma coragem que Remi só podia admirar.

Este pensou que, sem dúvida, um fragmento de metal ou de vidro a teria ferido. Tirou o telemóvel do bolso e telefonou para a polícia. Explicou brevemente o que tinha acontecido e prometeram enviar imediatamente um helicóptero.

Então, telefonou ao seu capataz, Paco, ao qual também explicou o acontecido, e pediu-lhe que fosse, com outro empregado, buscar o seu carro. Dessa maneira, Paco poderia esperar que chegasse a polícia para responder às perguntas. Ele planeava acompanhar a mulher ao hospital. Assim que se certificasse de que estava bem, falaria ele mesmo com a polícia.

Sentia-se responsável pelo acidente, já que pensava que talvez pudesse tê-lo evitado, se não estivesse a pensar noutra coisa. Ao desligar o telefone, apercebeu-se de que vários carros tinham parado para oferecer ajuda.

– Não os deixe aproximar-se, por favor – suplicou a acidentada, agarrando-lhe uma mão com força. Inclusive, cravou-lhe as unhas nas palmas.

Remi não se importou, já que lhe parecia incrível o controlo que estava a ter. Disse aos outros condutores que a polícia estava a caminho e que podiam seguir caminho.

– Como te chamas? – perguntou-lhe, tratando-a por tu, quando voltaram a estar sozinhos.

– Ji… Jillian Gray.

– Tens um marido ou um namorado a quem possa telefonar?

– Não.

– Estás aqui com algum amigo ou familiar?

– Não – respondeu ela. Parecia emitir cada palavra com um tremendo esforço.

– Aguenta mais alguns minutos, Jillian. Já consigo ouvir o helicóptero a aproximar-se. Os paramédicos aliviar-te-ão as dores.

– Ainda tenho o olho na órbita? – perguntou ela, com o pânico reflectido na voz.

– Certamente. Vai correr tudo bem. Já não estás a sangrar. Não chores, já que, se o fizeres, o sal das lágrimas poderá irritar-te o olho.

– Está bem – respondeu Jillian, com o queixo trémulo.

Ver aquilo recordou a Remi como ela estava a ser valente. Queria perguntar-lhe muitas coisas, mas sabia que os paramédicos fariam as perguntas oportunas. Além disso, naquele momento, Jillian estava demasiado dorida para continuar a responder.

– Já está aqui o helicóptero.

– A minha mala…

– Não te preocupes com isso agora – disse ele e pensou que era melhor entregá-la à polícia, já que precisaria de ver o passaporte dela. – O importante é cuidar de ti. Mas certificar-me-ei de que te devolvam todos os teus pertences.

– Obrigada – sussurrou Jillian.

Três paramédicos saíram do helicóptero e aproximaram-se deles. Os minutos seguintes passaram muito depressa. Primeiro, examinaram-na e depois, puseram-na numa maca. Remi seguiu-os, enquanto a transportavam para o helicóptero. Quando entrou atrás deles e o aparelho descolou, ouviu sirenes. Olhou pela janela e viu que um dos carros da sua propriedade se aproximava do local do acidente. Pensou que Paco resolveria tudo com a polícia.

Aliviado, viu que estavam a ministrar a Jillian antibióticos e analgésicos por via intravenosa. Estava mais calma. Tinham-lhe posto um colar, para que não pudesse mexer a cabeça. Agradou-lhe o facto de que não estivessem a tentar interrogá-la.

Então, o paramédico que tinha ao lado pegou numa prancheta para anotar a informação.

– Como se chama?

– Remigio Goyo.

Don Remigio Goyo? – perguntou o paramédico, impressionado.

– Sim.

– Sei a sua morada. Vive na fazenda Goyo. Conhece esta mulher?

– Não.

– Viu o acidente?

– Sim – respondeu Remi, entredentes. – Ambos tentámos evitar atropelar um animal que estava na estrada.

– Ela disse-lhe o nome dela?

– Jillian Gray.

– Sabe se tem familiares?

– Não sei. A polícia descobrirá.

– É muito bonita. Tem um cabelo maravilhoso… cor de ouro.

Remi tinha tentado com todas as suas forças não pensar naquilo, nem na figura perfeita que se delineava sob a blusa simples e a saia que Jillian usava. Tinha aprendido que a beleza extrema escondia grandes defeitos e não ia permitir que esta voltasse a cegá-lo.

– É norte-americana. Sem dúvida, turista – comentou. – Mas é só isso que sei. Encontraram mais feridas, para além da que tem no olho?

– Não, mas vai precisar de ser operada para retirar o que quer que seja que lhe entrou no olho – explicou o paramédico.

– Quem é o melhor oftalmologista da zona? – perguntou Remi.

– O doutor Ernesto Filartigua, de Madrid. Opera no hospital de Santa Cruz.

– Então, diga ao piloto que nos leve directamente para lá. Eu vou telefonar ao médico. Quero que um perito se ocupe do caso.

– Normalmente, a nossa empresa não vai até ao norte de Toledo, mas fá-lo-emos por si.

Remi respirou fundo. Pela primeira vez, agradou-lhe o facto de o seu título fazer diferença. Havia uma vida em perigo, provavelmente por sua causa…

– Assine aqui e pedirei ao piloto que informe das nossas intenções – disse então o paramédico.

Remi assinou no lugar indicado e, enquanto o outro homem falava com a cabina de comando, tirou novamente o seu telemóvel do bolso para solicitar informação. Se fosse possível, queria falar com o médico antes que o helicóptero aterrasse.

Quando conseguiu falar com a recepcionista da clínica, esta informou-lhe que o médico estava a operar. Mas garantiu-lhe que, assim que pudesse, o informaria de que uma acidentada com um ferimento ocular se dirigia para o hospital.

Meia hora depois, o helicóptero aterrou na pista de aterragem que havia a leste da entrada do hospital. Os paramédicos apressaram-se a levá-la para as Urgências, onde Remi preencheu o formulário de admissão com os poucos dados que sabia de Jillian. Prometeu à enfermeira dar-lhe o resto da informação requerida quando falasse com o seu capataz.

Enquanto esperava na recepção, observou como vários médicos entravam na sala onde Jillian estava, para a examinarem. Pouco depois, apareceu um médico com bigode e um membro do pessoal do hospital indicou-lhe que se aproximasse para examinar a acidentada.

Quando o médico saiu, Remi dirigiu-se a ele.

– Doutor Filartigua?

– Sim?

– Sou Remigio Goyo, a pessoa que telefonou para pedir que fosse o doutor a tratar a senhora Gray.

– Pois, ela teve muita sorte por não ter perdido tempo, Don Remigio.

– O ferimento é grave?

– Um fragmento de vidro entrou-lhe no globo ocular direito. Neste momento, estão a fazer-lhe exames para a prepararem para a operação. Assim que conseguirmos ver que lesões causou o vidro, saberemos mais. Tem família em Espanha?

– Não. Onde posso esperar enquanto a operam?

– Há uma sala de espera no sexto andar, nesta ala.

– Então, estarei lá. Ouvi dizer que é o melhor – comentou Remi. – Posso entrar para a ver agora?

– Se o desejar, mas não é necessário. Está a dormir. Aconselho-lhe que vá beber uma chávena de café – respondeu o médico. – Parece precisar – acrescentou, enquanto se afastava.

O comentário do médico recordou a Remi que acordara sem nenhum apetite e que tinha rejeitado comer durante a sua reunião com Luis.

Sem pensar no que estava a fazer, aproximou-se da porta da sala onde estava Jillian. Queria vê-la pela última vez, antes de a levaram para a sala de cirurgia. O técnico de análises que estava com ela dirigiu-lhe um olhar frio, mas Remi tinha toda a sua atenção na pele de porcelana daquela mulher, da qual já tinham limpado o sangue. Vestida com uma camisa de dormir do hospital e com o cabelo penteado para atrás, a pureza das feições clássicas da cara estava ainda mais pronunciada.

Recordou o acidente e pensou que, se ele estivesse a conduzir mais devagar, talvez tivesse sido capaz de travar a tempo e ela teria tido mais espaço para manobrar o carro. Mas já não podia mudar o que tinha acontecido.

Precisava de um café mais do que nunca, por isso, dirigiu-se para a cafetaria. Quando estava a caminho, tocou o seu telemóvel. Era Paco.

– Já estamos na propriedade. A polícia chamou um reboque para levar o carro da mulher. O capitão Pérez, de Toledo, está à espera da tua chamada, Remi.

– Está bem – respondeu Remi e anotou o número de telefone que Paco lhe deu . Então, agradeceu-lhe e telefonou ao capitão para lhe dizer que Jillian ia ser operada.

De seguida, respondeu às perguntas que lhe fez o capitão, o qual lhe informou que, quando quisesse, poderia ir buscar as malas da acidentada ao posto de polícia de Toledo.

Não tinham descoberto muitas coisas, salvo que a mulher norte-americana, de vinte e oito anos, estava a conduzir um carro que tinha alugado em Lisboa, em Portugal, em nome da EuropaUltimate Tours.

Remi apertou os lábios e perguntou-se se implicaria que ela trabalhava na Europa. A polícia tinha assumido que trabalhava para a dita empresa. Inclusive, tinha telefonado para os escritórios centrais da empresa, em Nova Iorque, mas não tinha obtido resposta.

Agradeceu ao capitão da polícia e garantiu-lhe que estaria em contacto. Sem hesitação alguma, telefonou ao seu distribuidor de Nova Iorque, um homem com quem a família Goyo tinha trabalhado durante anos. Pediu-lhe que enviasse algum dos empregados dele à EuropaUltimate Tours, para que pedisse ao chefe de pessoal da empresa que lhe telefonasse para o seu telemóvel.

Enquanto esperava pela chamada, comeu na cafetaria e, quando estava a beber a sua segunda chávena de café, tocou o seu telemóvel. Em dois minutos, explicou a situação ao responsável pelo departamento de pessoal da EuropaUltimate Tours, onde lhe deram o nome e o número de telefone de David Bowen, o irmão de Jillian Gray, que vivia em Albany, em Nova Iorque.

Quando acabou de falar, apressou-se a dirigir-se para o elevador e a subir até ao sexto andar do hospital. O enfermeiro que havia na recepção informou-lhe que a senhora Gray ainda estava na sala de operações. Remi agradeceu-lhe, antes de se dirigir para a sala de espera.

Não havia ninguém na sala e pôde falar com tranquilidade ao telefonar ao irmão de Jillian.

– Senhor Bowen? – perguntou. – Sou Remi Goyo. Estou a telefonar-lhe do hospital de Santa Cruz, em Madrid. Antes de lhe explicar alguma coisa, deixe-me garantir-lhe que a sua irmã, Jillian, está bem. Mas sofreu um acidente de carro há algumas horas.

O irmão de Jillian gemeu.

– Eu fui a única pessoa que o presenciou, é por isso que estou a telefonar-lhe. Um fragmento de vidro entrou-lhe no olho.

– Meu Deus!

– O doutor Filartigua, uma eminência da cirurgia ocular em Madrid, está a operá-la agora mesmo. Pensei que gostaria de saber.

– Obrigado. Não posso acreditar que isto tenha acontecido… Não depois do que ela já passou – comentou o senhor Bowen, que parecia atormentado.

Remi agarrou o telefone com força.

– Há alguma coisa que o médico deva saber?

– O seu marido faleceu num acidente de carro em Nova Iorque, há um ano. Eu supliquei-lhe que ficasse connosco durante uma temporada, mas ela, como um soldado, regressou imediatamente ao seu trabalho como guia turística. É um negócio cansativo. Que estivesse sozinha, significa que, certamente, tirou o dia para descansar. Suponho que seja a sua maneira de suportar a dor pela perda do seu marido.

Remi compreendia muito bem aquela necessidade…

– Desde que enviuvou, esteve a tentar seguir em frente. E agora acontece isto… – continuou o irmão dela, mas falhou-lhe a voz.

Depois de saber da perda que Jillian tinha sofrido, Remi soube que esta quereria ter o irmão junto dela.

– Quando pode vir para Madrid? Irei buscá-lo ao aeroporto e trá-lo-ei ao hospital.

– Esse é o problema. A minha esposa está à espera do nosso terceiro filho daqui a um mês, mas a gravidez não está a correr muito bem. Tem toxemia. E, se piorar, terão de lhe antecipar o parto. Tenho medo de a deixar sozinha, caso corra alguma coisa mal, mas não quero que Jilly saiba a razão pela qual não posso ir vê-la. A minha irmã pensa que está tudo bem.

– Compreendo – respondeu Remi.

– Escondemos de Jilly o problema da minha esposa, para que não se preocupasse. Ela desejava ficar grávida, mas não teve tempo antes de Kyle morrer. Se descobrir que a minha esposa tem problemas… Não sei o que fazer. Não podemos dizer-lhe que não numa altura como esta. Seria demasiado para ela. Perguntou por mim?

– Ainda não – respondeu Remi, pigarreando.

– Sei que Jilly precisa de mim, mas não o reconheceria, já que é a maneira como se comporta.

Remi tinha sido testemunha da valentia dela. Quando lhe tinha perguntado se tinha família em Espanha, Jillian simplesmente tinha respondido que não e não tinha dado mais explicações.

Frustrado, despenteou o cabelo.

– Estarei junto da sua irmã nesta altura. Não me afastarei dela.

– Não posso pedir-lhe que faça isso…

– Mas eu ofereço-me. O acidente foi, em parte, por minha culpa – disse Remi e, sem preâmbulos, explicou a David Bowen o que tinha acontecido.

– Não foi por culpa sua. Eu também não teria travado o carro por causa de um animal. A essa velocidade, era demasiado perigoso – comentou o outro homem. – Simplesmente, estou muito agradecido por também não ter ficado ferido. O que teria feito a minha irmã sem a sua ajuda?

– Tê-la-ia ajudado qualquer outra pessoa que passasse por ali.

– Não o teria feito como você. Obrigado, senhor Goyo. Pode fazer-me mais um favor e informar-me assim que a minha irmã sair da sala de operações? Não importa a hora. Quando estiver acordada, gostaria de falar com ela. Entretanto, vou falar com a minha esposa e com o seu médico. Dependendo do conselho deste, talvez possa realizar uma visita rápida a Madrid.

– Não se preocupe com isso agora. Cuide da sua esposa e eu cuidarei da sua irmã.

– Não sei como pagar-lhe pelo que está a fazer, mas pensarei em alguma coisa. Por favor, dê-me o seu número de telemóvel.

Remi deu a David o seu número pessoal.

– Você faria o mesmo por mim, não é assim?

– Sim – respondeu o homem, com grande sinceridade.

– Então, já está. Falaremos mais tarde.